CCJ da Câmara vai mudar de nome para se adequar a tempos De Toni
Uma Comissão de Inconstitucionalidade e Injustiça está prestes a ser formada diante dos nossos olhos, presidida por uma catarinense
Hoje é o dia internacional da mulher, mas infelizmente terei que abrir a newsletter com um fato que nos causa ZERO orgulho: uma parlamentar catarinense representante do bolsonarismo radical vai presidir a mais importante comissão da Câmara Federal. Caroline de Toni desceu goela abaixo (mas talvez nem tanto) nas articulações dos partidos com o presidente Arthur Lira e vai ter uma caneta na mão para derrubar pautas e projetos de interesse social e para transformar a CCJ na CII, a Comissão de Inconstitucionalidade e Injustiça. E, claro, de muita falta de bom senso, para não dizer outra coisa.
Bizarro que a imprensa local tenha caído na ladainha de PRIMEIRA MULHER CATARINENSE. Isso não nos causa orgulho, ao contrário, é motivo de vergonha. Sabe por que? Vamos aos fatos.
Vi no Jornal
Não nos representa - Caroline de Toni ascendeu na política por conta das redes sociais, como a maior parte dos bolsonaristas olavistas radicais new generation. A pauta das mulheres nunca apareceu nos seus discursos, ao contrário. Ser “contra o aborto” é bandeira que causa orgulho na extrema-direita, mas ninguém é “a favor do aborto” e muito menos quer obrigar uma mulher a abortar.
O que movimentos feministas reivindicam é o direito das mulheres de terem um aborto seguro, conduzido por equipes médicas em espaços qualificados. Isso porque o aborto mata mulheres pobres que, muitas vezes em situação de desespero e sem o acolhimento do homem, recorrem a clínicas clandestinas ou tentam, sozinhas, realizarem o aborto. A luta sempre foi sobre o direito de não morrer e de não ter nossos corpos tutelados.
Na França - Essa semana, a França promoveu o direito ao aborto à sua Constituição. É o primeiro país do mundo a fazer esse movimento, seguindo a tradição revolucionária da sua história. No texto, expressa-se que “uma mulher tem a liberdade garantida de recorrer ao aborto". Perceba: ninguém está obrigando uma mulher a abortar. O que está assegurado é o direito de escolha e, portanto, da sua não criminalização e do seu direito a ter a própria vida preservada.
Anti o que? - De Toni é da mesma escola olavista/bolsonarista da deputada estadual Ana Campangnolo, que promove nesta sexta, em espaço público, um evento de sua agenda pessoal. Para quem não sabe, a deputada vende cursos e livros sobre o tema principal do congresso: o “antifeminismo".
Sei que você, que está me lendo aqui, não é ingênuo, mas antifeminismo não existe. O que infelizmente ainda existe são mulheres que se apropriam das conquistas de outras mulheres - como o direito a um mandato, por exemplo - para negarem nossos direitos alicerçadas em uma agenda que não é conservadora: é retrógrada.
Mulheres conservadoras existem e também têm direito de pensarem e agirem conforme sua agenda, mas essa agenda não pode representar a luta pela perda de direitos mínimos fundamentais.
Defender o retrocesso não é bonito, não é ideologicamente coerente e pode, inclusive, matar, afinal, é o pensamento machista de que mulher é objeto e propriedade que gera crimes como estupros e feminicídios. Antifeminismo existe tanto quanto um dos seus patriarcas, Olavo de Carvalho.
Sempre craques do jogo (duas mulheres feministas para a gente se orgulhar)
Débora Diniz - Professora, pesquisadora e ativista pela descriminalização do aborto seguro, exerce um papel importante e informativo no debate público. Por isso é perseguida e ameaçada, mas nunca resignada. Quem quer aprender sobre o tema sem se abraçar ao senso comum e aos discursos religiosos ou extremistas precisa ler ou ouvir o que ela tem a dizer.
Conceição Evaristo - Escritora e poetisa, representante do feminismo negro e ícone da cultura brasileira contemporânea. Conceição nos ensina sobre interseccionalidade - sobre como reconhecer que mulheres são diferentes a partir de características como classe e cor, por exemplo. Nessa entrevista ao Portal Catarinas, ela fala sobre o assunto.
De olho neles
Essa semana fucei os projetos catarinenses na Câmara Federal que envolvem o termo “mulheres".
Achei uma bizarrice do Novo - Mais prazo para continuar pagando menos para as mulheres, é sério isso?
E outra da mais nova presidente da Comissão de Inconstitucionalidade e Injustiça - Mulheres não se interessam por política e por isso não precisam de cotas, é sério isso? Ainda bem que tem gente que pensa diferente.
Fora isso, tem coisas legais da nossa pequenina bancada progressista - Como o Programa de Segurança e Acolhimento à Mulher, de Pedro Uczai. Tem também a proposta de implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica, da Ana Paula Lima.
Deu ruim
Zanatta perdeu de novo - A bolsonarista Julia Zanatta perdeu mais uma ação na justiça em que interpelava Leonel Camasão por seus posts combativos nas redes sociais.
A deputada tem utilizado a justiça com bastante recorrência para tentar intimidar seus críticos: essa semana mesmo um professor expôs no Youtube a estratégia. Dessa vez, ela usou uma lei feminista, de garantia de direitos da mulher, mesmo sendo uma crítica do movimento. Incoerência que chama?
Jorginho Mello e os filhos de novo - Essa newsletter deixa de ser temática aqui, porque é impossível não comentar que o filho do Jorginho Mello - dessa vez o Bruno, não o Filipe - lançou com pompa um curso de pós-graduação na Univali, uma das contempladas pelo projeto biolonário de financiamento das universidades pagas. Onde está o erro nisso?
Bom, que a família do governador é a mais talentosa e competente do estado a gente já sabe, mas qual seria a chance de uma universidade que está recebendo gordas verbas do governo de recusar uma proposta de pós-graduação liderada pelo filho de Jorginho Mello?
Considerações afinais
Hoje é o dia internacional da mulher e felizmente eu vou encerrar essa newsletter saudando e agradecendo aquelas que andam junto na luta por um lugar melhor e mais justo pra nós e pras nossas meninas. Saudações às mulheres que ocupam espaço na política, na ciência, que disputam espaço nas redes e no cotidiano, às que colocam seu corpo e seus direitos em risco pela sobrevivência de tantas outras.
Um beijo e um abraço carinhoso, com a certeza de que precisamos de um feminismo interseccional. Nós, mulheres, não somos iguais e quando ocupamos um lugar de privilégio devemos buscar e puxar aquelas que ainda não nos alcançaram.
Até a próxima ;-)
Imagem criada por IA