Em Santa Catarina, escola é sem partido, mas se for o deles pode!
Episódios recentes envolvendo a educação pública mostram projeto bolsonarista de cerceamento de liberdade e evangelização
Oi, pessoal!
Hoje vamos falar sobre um tema que é a raiz de todos os outros. É límpido e cristalino o quanto o projeto bolsonarista é inimigo da educação, dos professores e de qualquer coisa que tenha como missão ensinar sujeitos a pensarem por conta própria, de forma crítica. Episódios da semana em Santa Catarina, reduto bolsonarista, ilustram muito bem essa questão e é por eles que vamos começar.
Vem de barra de rolagem.
1 - Não vi no jornal
Doutrinação ou pregação? Na terça-feira (18), o perfil institucional da Polícia Militar de Florianópolis no Instagram publicou uma postagem que mostrava centenas de crianças enfileiradas nos bancos de uma Igreja Universal: era a formatura de 1050 alunos do Proerd. O texto listava os presentes no evento, dentre eles o prefeito e candidato à reeleição em Florianópolis, Topázio Neto (PSD), e celebrava o evento com "muitas brincadeiras e animação por parte do público presente".
A postagem foi alvo de questionamentos sobre a laicidade do Estado, mas o perfil do 4 Batalhão da PM respondeu, afirmando que o espaço foi cedido gratuitamente. No Instagram, a página ainda sugeria que usuários que tivessem alguma "proposta/ideia ou solução para sanar este e outros grandes desafios da segurança pública" teriam as portas abertas, afirmando que o espaço foi escolhido por não ter dado despesa aos cofres públicos.
Imagem criada por Inteligência Artificial
Tinha uma Universal no meio do caminho - Em dezembro de 2023, no entanto, a mesma página postou imagens da formatura de 143 alunos ocorridas no espaço da própria escola, na região Sul de Florianópolis. Já o perfil do Proerd celebrou, em novembro, uma formatura ainda maior, de 1.160 alunos, ocorrida nas dependências do Parque Beto Carrero World. O Proerd opera no Estado desde 1998, com conteúdos segmentados para crianças, 5º ano, 7º ano e Ensino Médio no combate às drogas.
Questionada sobre a opção de uma igreja para a realização do evento, a Tenente Coronel Naíma Huk Amarante afirmou que esta foi a primeira vez na história do programa que o 4 BPM promoveu uma formatura com tantas escolas ao mesmo tempo. "Não temos verba para pagar um espaço e formatura e, sendo assim, sempre buscamos parcerias, por isso aceitamos o Espaço das dependências da Igreja", disse.
A tenente reforçou que houve apenas a utilização do espaço, sem referência à religião ou crença em nenhum momento. "Inclusive não houve nem fala por parte do cedente do espaço", pontuou. Sobre a participação de políticos, ela disse que o programa atua em parceria com algumas empresas e prefeituras que patrocinam a aplicação do programa nas cidades.
2 - Deu ruim
Proibido ensinar sobre fake news - Enquanto milhares de estudantes recebiam seus certificados sentados nos bancos da Igreja Universal, a professora Carolina Puerto, da Escola Estadual Simão José Hess, em Florianópolis, vivia o primeiro dia do seu afastamento das salas de aula, em um processo da Secretária de Educação a partir de um áudio gravado sem o seu consentimento.
Carolina é professora do componente de Ciências Humanas no Ensino Médio e também atua no Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Santa Catarina (Sinte-SC). Poucos dias após o retorno de uma greve, foi surpreendida com uma abordagem inesperada da Coordenadoria Regional de Educação: queriam ouvi-la sobre um conteúdo gravado sem autorização durante uma de suas aulas.
Fake News e Crise Climática - Na aula preparada justamente na retomada da greve, ela falava sobre fake news, movida pelo contexto da crise climática do Rio Grande do Sul. Mudanças climáticas e direitos humanos são dois dos eixos temáticos do componente de Ciências Humanas. A professora abordou a temática de notícias falsas e desinformação justamente quando havia exemplos abundantes na rede. A Secretaria de Educação do Estado, após ouvi-la em uma reunião inesperada, abriu um Processo Administrativo Disciplinar por "militância".
Apoio - "A orientação à veracidade de informações é parte fundamental de uma formação crítica e propositiva cuja função social perpassa qualquer situação política, seja ela do estado, do país e até mesmo do mundo", disse a nota divulgada pelo Coletivo Juntas em SC com relação ao episódio. O coletivo ainda diz que o "magistério catarinense tem sido alvo de um desmonte e cujo cerne, parte de uma lógica de desvalorização docente e misoginia, tendo em vista que trata-se de uma carreira majoritariamente de mulheres".
A professora também recebeu uma manifestação de apoio no formato de carta aberta à comunidade escolar, em que os docentes da escola falam em "sanção indevida por parte da Secretaria de Educação". Eles também trazem elementos técnicos sobre o conteúdo ministrado e censurado, que integra o escopo do Novo Ensino Médio. "Segundo tal documento, é dever do professor 'identificar e promover ações de esclarecimentos a respeito da disseminação de fakenews, crimes cibernéticos, entre outros, nas múltiplas territorialidades e escalas'". Procurei a Secretaria de Educação de SC, que não se manifestou sobre o ocorrido.
Pelo menos uma vitória - Apesar das notícias pesadas, pelo menos uma coisa podemos comemorar: o Escola sem Partido perdeu uma ação de danos morais movidos contra o governo de Santa Catarina em função da conduta de uma professora acusada de dar “opiniões pessoais constrangedoras” na aula de história. A decisão já é na segunda instância e faz uma justa defesa do papel da educação. O caso foi publicizado em 2018, quando a professora fez críticas ao então candidato a presidente Jair Bolsonaro em sala de aula.
3 - De Olho Neles
Papelão - A Universidade do Extremo Sul Catarinense pagou um grande mico ao fazer uma nota de repúdio a um trabalhador do seu quadro por expor críticas à deputada federal Julia Zanatta (PL) em seu perfil pessoal. A nota fala em cultura da paz e defende o caráter plural e democrático da instituição. Sem pé, nem cabeça, o conteúdo foi massacrado nas redes da universidade ao longo da semana.
Papelão 2 - Tava escrito que Jorginho Mello ia recuar da sua posição inicial bem cautelosa e até coerente (em se tratando dele, claro) sobre a PL do estupro. Sempre jogando pra torcida bolsonarista, ele recuou em uma segunda rodada de perguntas sobre o assunto.
Papelão 3 - Também tava escrito que Santa Catarina ficaria bem distante das metas de vacinação da poliomielite. É muito curioso como bolsonaristas são a favor da família, da vida e das crianças, mas continuam difundindo discurso anti-vacinação junto a esse público e evitando qualquer incentivo. Fez falta uma postagem ou fala pública do governador sobre o assunto durante a campanha organizada pelo Ministério da Saúde.
4 - Craque do Jogo
Chico Buarque - Meu caro amigo, a coisa aqui tá feia, mas os seus olhos continuam lindos. Chico oitentou e eu lembrei, aqui, o mais perto que já cheguei dele…mentira, eu fui num show do Chico no Teatro Guaíra em 2012. Um dos melhores shows, em termos de qualidade sonora, que já presenciei. Viva a arte desse jovem senhor, a quem idolatro também pelos livros maravilhosos que escreveu.
André Báfica - Anônimo para muitos, mas bastante reconhecido na comunidade científica de imunologia, o professor da UFSC teve uma decisão favorável na justiça, em ação que movia contra o jornalista Moacir Pereira, responsável por divulgar fake news com o seu nome em 2021. Foi um ataque gratuito à ciência, à universidade e ao pesquisador.
5 - Considerações afinais
Por aqui encerro, esperando muito que o frio chegue de uma vez, que o Bolsonaro seja preso de uma vez, que Santa Catarina respire de uma vez. E por falar em Santa Catarina, vocês viram que tivemos mais prefeitos presos?
Até semana que vem ;-)
Que ódio!