Vencemos uma! Sentença contra deputada radical é celebração ao jornalismo
Irão nos calar? Hoje não!
Oi, gente!
Por aqui sextou na quinta e na sexta-feira, em uma semana na qual finalmente tive uma sentença para celebrar. Para quem ainda não viu, a Justiça de Santa Catarina indeferiu a ação judicial da deputada federal Julia Zanatta (PL-SC) , que pedia a censura de uma postagem minha de dezembro de 2023 usando dados públicos do Portal da Transparência. Ela também queria indenização por danos morais.
Como vem acontecendo com cada etapa dos três processos que ela e o marido movem contra mim, esse vai ser o tema da cartinha de hoje, muito embora o Brasil siga fervendo de notícias, e Santa Catarina também não fique nada longe disso com tantos casos de imoralidades/ilegalidades se entranhando no governo estadual.
Então vamos conversar? Daquele jeito, subvertendo a forma tradicional da newsletter em casos especiais.
Ganhamos!
Era umas 16h de uma segunda-feira quando Lucas Mourão, meu advogado, me enviou um presente de aniversário e de Natal antecipados:
“Percebo que a publicação da ré, ao reagir a informações públicas e ao conteúdo de outra matéria jornalística que falava sobre a autora, não extrapolou os limites da liberdade de expressão, sobretudo porque não divulgou fake news, mas sim, realizou severa crítica política destinada à autora, sem se utilizar de orientações/interesse”
A sentença assinada pelo juiz Marcelo Carlin, do 2º Juizado Especial Cível da Comarca de Florianópolis, expressou de forma clara que reagir a informações públicas como fiz não é um problema jurídico. Mas foi além: fez uma defesa justa da minha profissão.
Destaco que a requerida é jornalista, desempenhando um papel crucial em um estado democrático de direito, pois garante que a população tenha acesso a informações, que os cidadãos acompanhem, fiscalizem e construam sua opinião sobre figuras públicas
Nesse ponto, preciso mencionar o apoio dos meus advogados, que me ajudaram a construir uma defesa que demonstrou de forma sólida que o tweet que ela tentou censurar era fruto de um trabalho jornalístico, portanto, amparado em ferramentas técnicas da profissão.
A ré comprovou que buscou a informação sobre os gastos da parlamentar requerente por meio do portal da transparência e, após constatar o pagamento/NF em favor do Jornal A Razão, verificou matéria publicada após alguns dias do pagamento e, com isso, formulou o seu comentário.
Nós mostramos, na defesa, o passo a passo da minha apuração: começou com uma desconfiança sobre os valores gastos com a cota parlamentar num único mês, passou pela análise detalhada dos gastos com a rubrica de divulgação da atividade parlamentar, com a pesquisa no conteúdo do Jornal Razão e no histórico de medidas da Receita Federal que comprovavam o que o juiz reiterou.
Na notícia que questionei no meu tweet que ela tentou censurar, o Jornal Razão dizia que Zanatta era responsável por prorrogar o pagamento dos impostos para micro-empresários atingidos pela enchente de outubro/novembro do ano passado em Santa Catarina. A sentença reitera minha apuração, apresentada como parte da defesa.
Está demonstrado que a Receita Federal não reconheceu nenhum vínculo entre a conduta da autora (envio de ofício ao secretário da Receita Federal) e a concessão da prorrogação do Simples Nacional na região do Alto Vale, constando apenas que a edição da portaria para essa finalidade é uma possibilidade em casos de calamidade semelhantes, ficando condicionada apenas ao decreto estadual.
O juiz ainda faz uma expressiva defesa da importância do jornalismo:
A imprensa auxilia a transformar informações em conteúdo compreensível para todos, promovendo um debate público acessível a todos e essencial para o funcionamento de uma democracia vibrante.
É importante dizer que isso aconteceu porque a defesa, além da fundamentação teórica e jurídica do campo do Direito, abraçou aspectos da práxis jornalística, defendendo não só a mim, mas a todos e todas que exercem o jornalismo independente de forma técnica, com métodos de apuração e checagem. Nossa atividade jornalística não é amadora, o trabalho é orientado por técnicas consolidadas e efetivas na transformação de dados em fatos.
O juiz apontou que minhas críticas foram severas, mas também lembrou que uma parlamentar está sujeita à fiscalização e críticas. Isso também é importante para outras causas que políticos venham a mobilizar contra aqueles que cobram sua probidade, moralidade e competência.
Necessário levar em consideração também que autora é parlamentar, ou seja, figura pública, portanto, está sujeita às críticas exacerbadas, conforme inúmeros precedentes.
Também preciso lembrar a todos que, mesmo sendo derrotada em sucessivas sentenças, Julia Zanatta segue movendo processos contra jornalistas. Não fui a primeira e nem a última vítima, aliás, ainda respondo a uma ação criminal por parte dela e outra civil por parte do marido.
Ela, que é citada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) como “litigante contumaz” e como a quinta personalidade que mais move ações intimidatórias contra nós, caçoa desse título e já disse, nas suas redes, que quer subir neste ranking.
Não estamos livres de novos ataques, nossas redes de proteção continuam tímidas, e não fossem organizações como a Media Defence e a Abraji, eu não teria acesso a uma defesa tão especializada em liberdade de imprensa. Precisamos, sempre, comemorar as pequenas vitórias, mas há inúmeros obstáculos que devem nos preocupar.
Para quem quer saber um pouco mais sobre essa história, essa reportagem do Portal Catarinas é um ótimo resumo. E também já contei, aqui mesmo, nesta newsletter, como me tornei vítima do assédio judicial.
Quem quiser também pode ver esse material no Instagram, que transmiti logo depois da divulgação da sentença.
Obrigada a todo mundo e a cada um/cada uma que me acolhem e me fortalecem e encorajam nessa luta. Eu queria colar na minha parede todas as mensagens maravilhosas, confortantes e inspiradoras que tenho recebido. É bom demais saber que, se estou pagando algum preço por tentar produzir informação crítica, é por um motivo que me move: se eu conseguir informar alguém, gerar debates, trazer assuntos ocultos e mostrar da política aquilo que poucos têm interesse em mostrar, já me darei por satisfeita.
Até a próxima ;-)