Governo de SC usa verba da educação em propaganda. E pode?
Vamos ter que aguardar os órgãos de fiscalização e controle avaliarem as contas públicas em que recursos da educação são aplicados para outras finalidades
Oi, gente! Como estão vocês?
Por aqui, sensação de ar mais limpo, mas com muita fuligem e queimada espalhadas pelo Brasil. A boa notícia é que não temos um governo federal negacionista e as ações já começam a ser planejadas. A dúvida que fica, entretanto, é de quando elas serão de fato priorizadas. E isso também deve ser cobrado em nível estadual e municipal, portanto, rejeite discursos genéricos e cobre, de fato, seus candidatos sobre o que eles planejam fazer para lidar com tudo isso (para quem mora em Florianópolis, recomendo esse levantamento da jornalista Raphaela Suzin).
Uma boa tática para enfrentarmos o problema é ficarmos de olho no orçamento. Aqui eu já havia falado um pouco sobre isso acompanhando a tragédia climática do Rio Grande do Sul. Projetos do governo aparecem no orçamento. Se o investimento em meio-ambiente é baixo, é lógico, claro e cristalino que não há projetos.
Peço sua atenção porque vou mudar um pouco o curso dessa conversa. Vamos falar sobre orçamento, mas olhando para a educação. Puxa seu banquinho e vem sentar comigo?
Imagem criada por Inteligência Artificial
1 - De olho neles
Dinheiro para quem? - O governo de Santa Catarina, liderado pelo bolsonarista Jorginho Mello, tem pelo menos R$15 milhões empenhados do Programa Educação Básica com Qualidade e Equidade na Secretaria de Comunicação. O objetivo, segundo consta no Portal da Transparência, é a operacionalização da veiculação de mensagens de utilidade pública, de caráter educativo e/ou informativo nos veículos representados pela Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão (ACAERT).
A Acaert "trabalha em prol da profissionalização e fortalecimento do segmento das emissoras de Rádio e Televisão de Santa Catarina" e tem como princípios a "valorização da programação regional, profissionalização do radiodifusor, fortalecimento dos seus associados, incentivo ao crescimento do mercado, valorização das pequenas emissoras, além da preocupação com as soluções dos problemas comunitários". Tem 260 emissoras de rádio e 24 emissoras de televisão associadas e, no seu conteúdo institucional, não registra seu papel educativo.
Em contrapartida, o Programa Educação Básica com Qualidade e Equidade é um dos principais orçamentos da secretaria da Educação do Estado, atrás apenas do caixa de onde saem os pagamentos de pessoal e programas de formação. No total, já tem empenhados, em 2024, cerca de R$1,5 bilhões para as mais diversas finalidades, incluindo também recursos para a Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE) e para a Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Essas duas últimas, entretanto, somadas, garantiram R$7,2 milhões - menos da metade do que foi destinado à comunicação, ainda que a educação seja sua primeira finalidade.
Cofre cheio - Na pasta da comunicação, a verba da educação é a segunda mais volumosa do orçamento total. O orçamento da área é pulverizado para o pagamento de fornecedores e de mídia. Entre os credores, estão a NSC TV Florianópolis, retransmissora da Globo, que recebeu R$7,5 milhões em 2024, e a NDV TV Florianópolis, retransmissora da Record, com R$6,5 milhões. Ambas também são associadas à Acaert.
Paralelamente, o governo vem sendo cobrado quanto aos investimentos em educação. Em abril deste ano, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte) entrou em greve para solicitar mudanças na carreira e um novo concurso para professores efetivos. Na quarta-feira (18), o sindicato anunciou considerar insuficiente o projeto de lei enviado pelo governo à Assembleia Legislativa como parte do acordo que pôs fim ao movimento.
Constituição - A constituição federal exige que os governos estaduais e municipais devem usar no mínimo 25% da receita de impostos para a Educação. Segundo o professor Marcos Bassi, do Centro de Ciências da Educação da Universidade Federal de Santa Catarina, a regra protege os recursos necessários à área. Ele lembra que tanto no período do Estado Novo quanto ao longo da ditadura militar o campo do ensino ficou desprotegido, fazendo com que a medida de vinculação orçamentária fosse necessária.
Bassi também explica que a Lei de Diretrizes e Bases traz um detalhamento do que pode e do que não pode ser considerado como despesa de manutenção e de ensino. A remuneração e o aperfeiçoamento de pessoal, a aquisição de material, o transporte escolar, a aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos estão entre os investimentos permitidos.
Por outro lado, há outros, de natureza mais imprecisa, como o uso e manutenção de bens e serviços vinculados ao ensino e a realização de atividades-meio necessárias ao funcionamento dos sistemas de ensino. No campo das proibições, a lei não permite, por exemplo, obras de infra-estrutura e subvenção a instituições públicas ou privadas de caráter assistencial, desportivo ou cultural.
2 - Vi (e não vi) no Jornal
Educação ou turismo? Assim como o governo do Estado, prefeituras também operam os cofres da educação pagando despesas que podem levantar dúvidas quanto à sua finalidade educativa. Em Joinville, por exemplo, o prefeito Adriano Silva (Novo), candidato à reeleição, usou rubricas da educação em contrato para uma obra de turismo que teria como uma de suas finalidades atividades educativas e escolares.
Em debate, ele chegou a ser confrontado pelo adversário Rodrigo Bornholdt (PSB), mas explicou que a verba da educação será usada para um laboratório de botânica, parte da obra do "Palácio das Orquídeas".
Festival - Em Mafra, no Planalto Norte do Estado, o também candidato à reeleição Emerson Maas (MDB) utilizou verbas do Fundo Municipal de Educação de Mafra para a promoção do III Festival de Inverno, que ocorreu em julho, com organização da Secretaria Municipal de Educação, Esporte e Cultura.
Para pensar - De acordo com Bassi, os gastos em educação passam pelo escrutínio do Tribunal de Contas do Estado e são lidos a partir daquilo que a legislação assegura como manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE). Ainda assim, para ele, é possível que articulações políticas suavizem eventuais punições ou registros de conta irregular.
O professor aponta o que, para ele, caracterizaria um rol de boas práticas de uso do orçamento público em educação. "A remuneração dos professores é fundamental, com concurso público para ingresso de efetivos e formação. É preciso que a carreira seja atrativa para não haver vínculos precários", justifica.
Bassi também aponta que investir em escola em tempo integral e ampliar a oferta de vagas na educação infantil seriam outras demandas urgentes para a melhoria da qualidade nos investimentos. Ele também argumenta que há críticas de vertentes liberais que apontam que o estabelecimento dos 25% mínimos para se investir na área poderiam engessar o orçamento público, mas para ele se trata de uma proteção necessária.
Inserções- A Acaert foi procurada para falar sobre os projetos junto ao governo do Estado e sua finalidade educativa e respondeu que o serviço é de "veiculação de inserções em rádio e TV”. A secretaria de Educação de Santa Catarina foi procurada, mas não se manifestou.
3 - Deu ruim
Agenda azedou - Tem bolsonarista chorando por toda Santa Catarina. O ex-presidente chegou ao Estado para agendas em Criciúma e Balneário Camboriú, mas a expectativa do PL era bem outra. Inclusive, antes de a campanha começar era esperado que ele fizesse muitos passeios por aqui. O cenário e a conjuntura mudaram e Jair Bolsonaro escolheu a dedo onde vai pousar seu mau agouro. Diz-se que em Criciúma o clima é de medo que a candidatura de Ricardo Guidi esteja descendo ladeira abaixo. Já em Balneário, Bolsonaro tenta levar aquela força pro filho mais novo, candidato a vereador.
Observei, na última visita de Eduardo Bolsonaro ao Estado, que as agendas eram bem esvaziadas e modestas. Dessa vez, pelas imagens nas redes sociais, me pareceu que não vai ser fácil virar o jogo onde seus candidatos estão atrás (caso de Balneário, por exemplo).
Também destaco aqui a treta da deputada estadual Ana Campangnolo com o deputado federal Jorge Goetten e o senador Jorge Seif em função dessas agendas. Parece que a rinha tá feia. Difícil escolher um lado, né? (risos).
Corrente encontra festival gospel bancada com dinheiro público - A corrente da transparência bolsonarista que divulguei esta semana mostra que o prefeito de Porto Belo, Joel Orlando Lucinda (MDB), decidiu romper com o caráter laico do Estado e bancar um festival gospel com dinheiro da cultura. Duas cantoras contratadas receberam 200 mil. A montagem da estrutura custou mais 225 mil e o som mais 50 mil. O evento aconteceu um ano, mais um ponto para a gente criticar: agradando o eleitorado evangélico em ano eleitoral?
4 - Craque do jogo
Ter uma ministra ambientalista foi o que de melhor poderia ter acontecido ao Brasil depois de anos de negacionismo bolsonarista na pandemia. Marina Silva é a pessoa certa no lugar certo para enfrentar os gravíssimos problemas ambientais que estamos vivendo. E se as coisas nem sempre andam num ritmo ágil, também porque o Estado é uma estrutura que tem um ritmo próprio, saber que é ela quem está lá tranquiliza.
5 - Considerações afinais
Também tivemos nessa semana o resultado da pesquisa NSC TV para a prefeitura de Florianópolis, apontando para alguma tendência de que o atual prefeito, Topázio Neto, se reeleja no primeiro turno. Topázio também foi alvo de uma reportagem da Repórter Brasil com dados sobre a gestão das suas empresas. Falei sobre isso aqui na semana passada.
A pesquisa mostra o que a gente já vinha dizendo há bastante tempo: não há espaço para duas candidaturas competitivas à esquerda na Capital de SC. Uma frente ampla poderia ter assegurado a disputa ao segundo turno, mas agora me parece que há muitas chances de Topázio Levar de primeira. Vamos aguardar.
Volto já já! E não esqueçam de me acompanhar aqui. Tô mais ativa na área.